Perspectivas no campo fazem investimento em bens de capital crescer 33,7% no setor este ano
As importações de bens de capital para a agropecuária dispararam neste ano, embaladas pela perspectiva positiva do setor. Em contraposição, as compras de bens para a indústria de transformação vêm perdendo fôlego, refletindo incertezas por conta de gargalos nas cadeias e pressões de custo. Esse contraste, segundo economistas, deve se manter no ano que vem, mas com menor força.
Em novembro, as importações de bens de capital para a agropecuária cresceram 82,5%, em volume, na comparação com novembro de 2020, depois de terem crescido 112,2% em outubro, segundo dados do Ministério da Economia, compilados pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). As compras para a indústria de transformação subiram 2,1%, após alta de 32,7% no mês anterior.
No acumulado do ano até novembro, as importações de máquinas e equipamentos para o setor agrícola cresceram 33,7%, e as compras para a indústria de transformação avançaram 7,8%.
Em relação a bens intermediários, em novembro a importação para agropecuária cresceu 18,4%, e para a indústria teve alta de 8,9%. No acumulado do ano, contudo, a alta foi de 14,6% para agro e de 27,7% para o setor manufatureiro. Os dados são do boletim do Indicador de Comércio Exterior (Icomex), divulgado ontem.
Segundo Lia Valls Pereira, economista do FGV Ibre, a discrepância entre as importações reflete expectativas diferentes da agropecuária e da indústria de transformação. “Para o setor agrícola havia perspectivas melhores, enquanto para a indústria a confiança tem sido baixa de modo geral”, diz. “Os problemas nas cadeias podem estar afetando mais o setor industrial do que o agropecuário. As perspectivas de crescimento também pesam nisso.”
Em sua última edição, o Boletim Macro, do FGV Ibre, prevê crescimento de 1,3% do setor agrícola em 2021 e 5% em 2022. Para a indústria como um todo, a perspectiva é de expansão de 4,4% em 2021 e de contração de 1,1% em 2022. A indústria de transformação puxaria a queda, contraindo-se 3,2%.
Além de números de importação, dados sobre produção reforçam o otimismo com a agropecuária, em contraposição à indústria. A Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) de outubro mostra crescimento de 40,3% da produção de maquinário agrícola de janeiro a outubro de 2021, ante o mesmo período do ano anterior, observa Matheus Ferreira, economista da Tendências Consultoria, responsável pelo setor de bens de capital. No que se refere a maquinário para fins industriais, o crescimento foi de 17,1% no período.
“Juntando os dados de produção e de importação, vemos que a demanda doméstica por máquinas para a agricultura está muito mais dinâmica do que a por bens industriais”, diz o economista.
Segundo Ferreira, esse dinamismo da demanda doméstica em agro é explicado pelo forte aumento dos preços das commodities nos últimos meses – e a estabilização desses em patamares elevados – e pela depreciação do câmbio.
“Os preços altos das commodities favorecem o rendimento dos agricultores. O real muito depreciado, como está, aumenta a rentabilidade”, afirma. “A conjunção desses fatores fez com que os produtores capitalizassem muito e pudessem renovar a frota e investir em máquinas novas.”
Analisando os bens industriais, o quadro é diferente. “Houve uma recuperação inicial [da atividade industrial] no segundo semestre de 2020, mas que foi revertida neste ano. Vemos perda de dinamismo associada a fatores como pressão de custos, inflação ao produtor, desarranjo de cadeias de produção, e a própria abertura da economia, que deslocou a da demanda de bens por serviços, prejudicando a indústria”, diz Ferreira.
O último Boletim Macro mostra que os gargalos são citados por 20,4% das empresas como limitador à expansão dos negócios. A parcela de empresas com esses problemas é mais expressiva nos segmentos ligados à produção de bens duráveis, onde 56,4% reportam dificuldades, após recorde de 65,5% no segundo trimestre.
O otimismo no setor agrícola deve levar ao recorde de vendas de maquinário neste ano, afirma Pedro Estevão Bastos, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).
“Estamos em um momento de rentabilidade muito alta em culturas de exportação como soja, milho, café, algodão, celulose, cana-de-açúcar e carne. Essas culturas representa 80% do mercado brasileiro de máquinas”, afirma Bastos.
Segundo a Abimaq, em 2020 a venda de máquinas teve crescimento real de 17% em 2020. Para este ano, a alta prevista é 40%.
“Os números para este ano são recorde e ocorrem em função também do aumento da área plantada. Para a safra de verão, que foi praticamente toda plantada entre setembro e novembro para ser colhida em fevereiro, houve aumento de 3,6% da área cultivada. A expectativa é de colheita recorde no ano que vem, e já temos as máquinas para isso”, diz. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que a safra de grãos no ano agrícola 2021/22 seja 14,2% maior do que no ciclo anterior.
A perspectiva é que a discrepância entre o setor agrícola e a indústria de transformação, refletida nas exportações de bens de capital, continue no próximo ano, mas com menos força.
“A previsão é de perda de dinamismo de bens de capital como um todo, mas menos em agropecuária e mais para indústria. Esperamos arrefecimento da produção e da importação”, diz Ferreira.
A Tendências Consultoria prevê que a produção de maquinário agrícola cresça 36,8% neste ano e tenha ligeira queda de 0,9% em 2022. Para a indústria, as projeções são de alta de 12,2% neste ano e de queda de 3,7% no próximo ano.
Bastos afirma que 2022 será um ano mais desafiador para o setor agrícola. Os problemas com insumos, com forte alta dos preços de defensivos e fertilizantes, persistirão e o ciclo de alta da taxa de juros deve inibir investimentos. “Em 2022 não teremos nenhuma linha do Plano Safra funcionando. Isso significa que em vez de uma taxa de juros de 8,5% ao ano do Programa de Modernização da Frota de Tratores Agrícolas e Implementos Associados e Colheitadeiras (Moderfrota), o produtor terá de ir ao mercado e pagar juros de 15%.”
Fonte: Valor Econômico (https://valor.globo.com/brasil/noticia/2021/12/17/agro-importa-maquinas-industria-freia-compras.ghtml)
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