Forte demanda por máquinas agrícolas

Valor – Produtores rurais estão capitalizados com os bons preços das commodities, mas indústrias não conseguem atender os pedidos por falta de componentes

Em plena explosão da demanda por máquinas e implementos agrícolas, na esteira da elevada capitalização e boa capacidade de tomada de crédito dos empresários do campo, a indústria não consegue atender a carteira de pedidos e, para alguns tipos de equipamentos, como colheitadeiras, há espera de oito meses.

“Infelizmente a crise de falta de componentes faz com que o setor de máquinas agrícolas e de construção continue enfrentando os piores anos na sua história recente. Nossa cadeia global de fornecedores continua desorganizada – efeito da pandemia –, apresentando escassez de componentes eletrônicos, mas também pneus, resinas plásticas, peças metálicas, forjados, entre outros. Isso tem gerado enormes desafios logísticos que afetam negativamente a nossa capacidade de produção e os nossos custos”, diz Alexandre Bernardes, vice-presidente da Associação dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

Com esse quadro, as subsidiárias brasileiras dos maiores grupos produtores mundiais de máquinas para o campo buscam sua rede global de abastecimento sem conseguir equilibrar seu nível de produção ao ritmo da demanda local.

Segundo o presidente do conselho de administração da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq), João Carlos Marchesan, o setor vem de um ciclo de alta expressiva em 2020 e 2021, com aumento do faturamento de 17,7% e 42,5%, respectivamente. “Para 2022, esperamos crescimento de mais 5% sobre uma base que avançou muito, com alta nas vendas desde 2017.” No acumulado deste ano, até maio o aumento é de 7,9% nas vendas.

O anúncio de quase R$ 341 bilhões em crédito rural para o período de 2022/23 é o maior valor nominal ofertado em um Plano Safra e esse montante, na projeção dos fabricantes de máquinas, deve contribuir para a manutenção do ritmo do agronegócio, apesar de não contemplar toda a demanda por crédito, especialmente a do pequeno produtor rural.

Para a John Deere, uma das maiores montadoras de máquinas agrícolas do país, o protagonismo global do agronegócio brasileiro está só começando. “O mundo começa a perceber sua dependência do setor e a responsabilidade que o Brasil tem como produtor de grãos e proteínas. O ano começou com a previsão de crescimento de mercado próximo de 5%, mas a visão mudou por causa da demanda global por grãos, proteínas e fibras fortalecida pela guerra na Ucrânia”, diz Marcelo Lopes, diretor de vendas da empresa.

A estimativa é de um avanço do mercado mundial de máquinas agrícolas de 10%, sendo que o maior crescimento é na América Latina. “Nos últimos anos, o Brasil se tornou o maior mercado global de colheitadeiras e plantadeiras (considerando todas as marcas), superando os Estados Unidos”, lembra Lopes. O relatório trimestral da John Deere, divulgado em maio, aponta que a expectativa do mercado é um aumento de 10% nas vendas de tratores e colheitadeiras na América do Sul, com o Brasil como propulsor desse crescimento.

Para corresponder a esse ritmo de crescimento, a John Deere, em 2018, comprou a argentina PLA, fabricante de pulverizadores, semeadores e outros produtos para a agricultura. A incorporação da PLA permitiu a ampliação do portfólio de pulverizadores disponíveis ao mercado brasileiro. Em 2020, concluiu a aquisição da Unimil, uma empresa brasileira líder em peças de serviço pós-venda para colhedoras de cana-de-açúcar para tornar seu portfólio mais abrangente.

Na CNH Industrial, “a pujança do mercado agrícola brasileiro é destaque dentro do seu mercado global”, afirma Thiago Wrubleski, diretor da empresa para a América Latina. Nos últimos anos, a CNH fez importantes aquisições perseguindo a rápida evolução dos produtos e soluções dos segmentos em que atua. Em 2021, adquiriu a Raven Industries, líder americana em tecnologia de agricultura de precisão, que é referência em sistemas autônomos, por US$ 2,1 bilhões.

“É um compromisso com a automação, na qual a máquina se autorregula e dirige sozinha, uma máquina totalmente autônoma, ou seja, um robô na fazenda”, diz Wrubleski. Ele diz que, com o protagonismo agrícola do Brasil, em breve os benefícios e os resultados dessa parceria estarão disponíveis. Outros exemplos são as aquisições da Monarch Tractor, empresa de tecnologia agrícola com sede nos Estados Unidos, com a qual a CNH já tem planos para a transformação da indústria agrícola em direção à autonomia e à eletrificação nos próximos anos, permitindo um agronegócio mais rentável e com emissão zero.

Houve a aquisição da AgDNA, líder em sistemas de informações de gerenciamento agrícola, que permitirá que os clientes se beneficiem das ferramentas de integração, mapeamento e análise de dados. E também a compra da Sampierana, empresa italiana especializada no desenvolvimento, fabricação e comercialização de máquinas de movimentação de terra, material rodante e peças de reposição, com uma linha completa de escavadeiras médias e míni. Há ainda a participação na Bennamann, empresa britânica de tecnologia agrícola que atua no segmento de energia limpa, com combustíveis alternativos.

“Essas aquisições foram feitas para que a empresa possa entregar o melhor avanço tecnológico e acelerar alguns processos. Sem dúvida, estamos nos tornando cada vez mais referência em inovação e tecnologia no Brasil e no mundo.” Segundo ele, há 30 anos, a defasagem da tecnologia das máquinas no Brasil frente às produzidas nos Estados Unidos e na Europa era de quase dez anos, mas hoje ela não existe mais. “Pela alta demanda da agricultura brasileira, introduzimos e implementamos novas tecnologias aqui no Brasil, antes mesmo que elas sejam introduzidas lá fora”, diz Wrubleski.

A AGCO, dona de marcas tradicionais de máquinas agrícolas, como Fendt, Valtra e Massey Ferguson, nunca registrara, em 24 anos de atuação no Brasil, o menor índice da história no seu financiamento próprio (AGCO Finance) para suas máquinas, diz Rodrigo Junqueira, gerente da empresa e vice-presidente da Massey para a América do Sul. “O campo está capitalizado, graças aos bons preços das commodities.”

Mesmo com as restrições de oferta de máquinas, a AGCO Finance prevê R$ 2 bilhões em financiamento em 2022, enquanto no ano passado o banco financiou R$ 1,5 bilhão. A oferta de crédito em moeda estrangeira, como dólar e euro, é a que mais atrai agricultores, “principalmente para compra de máquinas de alta potência. Nesta opção, é possível financiar 100% da operação, com carência de até 18 meses para início de pagamento das parcelas”, destaca Junqueira.

A AGCO também oferece o “barter” – venda com pagamento em grãos – exclusivamente para café, em parceria com concessionários e uma trading, que é a interessada final na venda do grão. Com foco em São Paulo e Minas Gerais, regiões cafeeiras, o “barter” é garantido pela própria safra do agricultor via cédula de crédito rural (CPR). O produtor rural adquire um trator para café e paga com a produção, com a quantidade de sacas acertada no momento da compra.

A Caterpillar, tradicional produtor de máquinas rodoviárias, vê cada vez mais aumento na demanda em fazendas, pequenas ou grandes, por equipamentos para movimentação de terra e tarefas paralelas ao plantio. Odair Renosto, presidente da Caterpillar Brasil, afirma que no primeiro trimestre de 2022 o crescimento de vendas foi de dois dígitos, inclusive no segmento agrícola, perfazendo um avanço de 26% na América Latina. As fazendas demandam sobretudo retroescavadeira, carregadeira, motoniveladoras, escavadeiras, compactador de solo, assim como várias ferramentas acopladas, como garras, lâminas, caçambas, trituradores etc. Toda a linha tem opção de financiamento pelo Banco Caterpillar na rede de revendedores da marca, que aponta uma demanda agrícola que representa 25% das vendas da Caterpillar no Brasil, e metade dessa procura vem do setor canavieiro.

“Nossos maiores desafios estão na restrição de fornecimento”, diz Renosto, lembrando que há urgência na ampliação da rede de telefonia celular no campo para absorver mais tecnologia da eletrônica embarcada, como os opcionais de fábrica em 2D e GPS 3D por celular ou satélite.

Como diz Bernardes, da Anfavea: “As nossas máquinas estão prontas para ‘falar’, mas poucos clientes conseguem ‘ouvir’ no campo. O grande desafio é universalizar a conexão, de forma que o pequeno agricultor familiar, assim como os médios e grandes produtores, seja mais produtivo e competitivo ao usufruir integralmente das tecnologias de ponta que já estão embarcadas em nossas máquinas”.

Foto: extraída da página da AGCO no Linkedin

Fonte: Valor (https://valor.globo.com/agronegocios/noticia/2022/07/29/forte-demanda-por-maquinas-agricolas.ghtml)

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